As vantagens da inclusão – e os riscos da exclusão – de aprendizes com deficiência

Publicado em: 22/11/2017


Veja como implantar um programa de aprendizagem para pessoas com deficiência. Ao contratar aprendizes com deficiência, a empresa atende exigências legais, necessidades sociais e ganha em promoção da diversidade em seu ambiente interno.

 

A aprendizagem profissional pode ser considerada uma maneira privilegiada de se fazer a inclusão das pessoas com deficiência, pois há a possibilidade do aprendiz ser contratado para um posto de trabalho de maior qualificação, evitando a entrada somente em cargos que exigem menor qualificação e de menor salário. A contratação do aprendiz com deficiência contribui também para que a empresa identifique e procure eliminar as eventuais barreiras existentes.

A empresa que contrata aprendizes com deficiência não está apenas implantando uma nova cultura organizacional, também está influenciando na forma como seus colaboradores enxergam o mundo, abrindo-se para novos desafios e desenvolvendo empatia para essa causa.

Quanto às pessoas com deficiência, além da própria ressignificação e do autodesenvolvimento, elas são impactadas socioeconomicamente ao entrar para o mercado de trabalho. Ou seja, tanto a empresa que realiza a inclusão de aprendizes quanto as pessoas com deficiência saem beneficiadas desse processo.

Exigência Legal e Multas

No Brasil vigoram duas leis de cotas para os quadros de funcionários de empresas –  Lei da Aprendizagem e a das Pessoas com Deficiência. Cada uma tem como objetivo contribuir para a inclusão social de pessoas que historicamente encontram barreiras para obter emprego. Na busca pelo atendimento das duas leis, as empresas identificam caminhos e desafios específicos de cada uma delas.

Nessa análise a seguir, a proposta é identificar soluções para o cumprimento de ambas de forma que todos ganhem: sociedade, pessoas com deficiência, jovens que precisam se preparar para o primeiro emprego e empresas.

Lei do Aprendiz

De acordo com a Lei No 10.097, de 19 Dezembro de 2000, empresas de médio e grande porte devem contratar jovens aprendizes, respeitando o percentual de, no mínimo 5%, e no máximo 15% do número total de empregados cujas funções demandem formação profissional.

Os aprendizes podem se candidatar a vagas de trabalho a partir dos 14 anos de idade até os 24 incompletos. Para se candidatar a uma vaga de aprendiz, o primeiro passo é o jovem participar de um curso preparatório, além de estar matriculado no ensino regular (fundamental ou médio).

Um levantamento feito pelo Ministério do Trabalho (MTb) em 2016, afirma que a cota de contratação de jovens aprendizes era de 956.725. No entanto, apenas 392.912 aprendizes estavam contratados, indicando que mais de 500 mil jovens não foram inseridos em programas de aprendizagem.

As empresas que não atendem essa cota estão sujeitas à multa de valor igual a 1 (um) salário mínimo regional para cada vaga de aprendiz em desacordo com a Lei, “não podendo, todavia, a soma das multas exceder a 5 (cinco) vezes o salário-mínimo, salvo no caso de reincidência em que esse total poderá ser elevado ao dobro”, de acordo com Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967.

O programa mescla teoria e prática. O jovem aprendiz tem que fazer um curso de capacitação – em uma ONG, escola técnica ou sistema S — para aprimorar habilidades na área que atuará na empresa. Ao mesmo tempo, tem a chance de vivenciar o dia-a-dia da companhia e exercitar o que aprendeu. É fundamental que ele esteja matriculado na escola ou na universidade (fonte site Aprendiz Legal).

Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência

Já a Lei 8.213, conhecida como Lei de Cotas para as Pessoas com Deficiência, determina que todas as empresas brasileiras com mais de 100 empregados são obrigadas a contratar um percentual de pessoas com deficiência. Este percentual varia de 2% a 5% do quadro de funcionários de acordo com o total de empregados.

A partir de 2010,  as empresas passaram a ser autuadas pelo não cumprimento da cota, recebendo multas de valores que variam atualmente entre R$ 2.284,05 a R$228.402,57, conforme Portaria MF Nº 8 de 13.01.17,publicada no Diário Oficial em 16.01.17.

As Procuradorias do Ministério Público do Trabalho (MPT) atuam, paralelamente, na aplicação de TACs (Termos de Ajuste de Conduta) opcionais, definindo valores de multas, prazos e medidas a serem cumpridas para que as empresas tivessem um tempo de implementação de ações inclusivas e regularizassem seu quadro de trabalhadores com o percentual exigido pela Lei de Cotas.

O aprendiz com deficiência atende às duas leis de cotas? Sim e Não!

Uma das dúvidas frequentes de gestores de empresas é se, ao contratar um aprendiz com deficiência esse poderá atender às duas cotas. A resposta é não – um único profissional não atende às duas exigências legais. Porém, a autuação referente à cota de pessoas com deficiência pode ficar postergada em número correspondente ao dos aprendizes com deficiência contratados.

Para isso, os gestores precisam adotar algumas medidas importantes. Uma delas é firmar, com o Ministério do Trabalho, um Termo de Compromisso em que a fiscalização se compromete a adiar a cobrança do preenchimento da cota de pessoas com deficiência, no número equivalente ao de aprendizes com deficiência, enquanto durar a aprendizagem profissional. Outra medida é estruturar um programa de aprendizagem de dois anos de duração, para que os participantes realmente tenham oportunidade de vivenciar na prática as rotinas da empresa e assim, se preparar para as etapas profissionais seguintes.

Além de contribuir para a inclusão social, uma das vantagens de se contratar o aprendiz com deficiência é que este estará atendendo à Lei 10.097 e a empresa tem ainda a oportunidade de capacitá-lo para que, ao final do contrato, possa ser efetivado por tempo indeterminado, atendendo então a Lei 8.213.

“Durante a aprendizagem profissional, o contato que o aprendiz tem com a empresa se dá em uma condição de maior proteção, porque ele não é um empregado regular da empresa, é um estudante, um aluno e, nesta condição, tem melhores chances de ir se adaptando e de conhecer o ambiente de trabalho, a cultura da empresa e os demais funcionários que, por outro lado, também têm a chance de se familiarizar com a presença do aprendiz com deficiência”, explica o auditor do Ministério do Trabalho e coordenador do Programa de Inclusão da Pessoa com Deficiência no Mercado de Trabalho Formal da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo, Dr. José Carlos do Carmo, Kal.

Para manter uma cultura organizacional inclusiva, a sensibilização tem que ser um processo contínuo e realizado por pessoas com conhecimento no assunto. Um dos resultados que se pode esperar da inclusão pela aprendizagem é a mudança de comportamento dos colaboradores,  a quebra das barreiras atitudinais, estigmais, estereótipos e discriminações e que, ao final do prazo, o aluno seja contratado como empregado por tempo indeterminado

“Assim que o prazo de aprendizagem for concluído cabe à empresa o preenchimento das vagas cujas cobranças foram adiadas. Não exigimos que o preenchimento seja feito com os mesmos aprendizes porque pode ser que o próprio aprendiz não tenha interesse em continuar na empresa, ou que não demonstre ter o perfil necessário para o desempenho da função”, informa o auditor.

Como implantar o Programa do Aprendiz com Deficiência

Mesmo quando a empresa firma o termo de compromisso com o MTb, só são aceitos contratos feitos diretamente entre o aprendiz e a empresa. Uma premissa é de que os cursos preparatórios tenham a parte prática nas próprias instalações da empresa, para que os aprendizes não cumpram a carga horária em laboratórios que simulem os ambientes de trabalho.

“A aprendizagem profissional para pessoas com deficiência tem uma particularidade que é a não existência de limite de idade, ou seja, enquanto para o aprendiz sem deficiência o limite é de até 24 anos, a pessoa com deficiência pode ser admitida como aprendiz aos 40, 50 anos”, informa dr. José Carlos do Carmo, Kal. “As habilidades da pessoa com deficiência têm maior apelo do que a escolaridade, pois ela vai atuar naquilo que tiver maior aptidão profissional”, acrescenta.

Uma medida básica que as empresas que ofertam vagas para um aprendiz com deficiência, é realizar um estudo de acessibilidade e oferecer capacitação aos gestores e colaboradores, para que a inclusão tenha sucesso e que todos fiquem cientes da importância do processo no âmbito profissional e social.

Outro diferencial do aprendiz com deficiência é que o seu período no programa de aprendizagem pode ser indeterminado, e não se limita ao de 15 a 24 meses (essa exigência é para os aprendizes sem deficiência).

A pessoa com deficiência pode acumular o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e o salário de aprendiz por um período de dois anos. Após esse período, caso o contrato de Aprendizagem tenha continuidade, o benefício fica suspenso. Assim como no caso do contrato profissional, o BPC pode ser recuperado se houver o desligamento da empresa.

Resumo dos pontos principais

  • Idade – No caso do aprendiz com deficiência não há uma idade máxima para a contração, enquanto para o jovem aprendiz sem deficiência a idade limite é de 24 anos incompletos.
  • Prazo – Os aprendizes com deficiência podem ficar no programa de aprendizagem por tempo indeterminado, enquanto que os aprendizes sem deficiência devem permanecer no programa por um período de 15 meses a 24 meses.
  • Requisitos – Além de estar matriculado em um curso preparatório, os aprendizes com deficiência devem também fazer uma avaliação funcional com um médico fisiatra, levando o laudo da deficiência com o CID, para quando for encaminhado a uma vaga de trabalho, certificar o empregador de que a deficiência se enquadra na Lei de Cotas.
  • Benefício – Os aprendizes com deficiência que recebem o BPC tem o direito de acumular o BPC e o salário de aprendiz no período de dois anos.

 

Por Ivone Santana e Isadora Pimenta, baseada em pesquisas e em entrevista com o médico do trabalho e auditor do Ministério do Trabalho e coordenador do Programa de Inclusão da Pessoa com Deficiência no Mercado de Trabalho Formal da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo, Dr. José Carlos do Carmo, Kal – 21/11/2017

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