Desembargador brasileiro faz palestra nos EUA sobre inclusão de pessoas com deficiência no trabalho
Publicado em: 21/11/2016
A história da inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho brasileiro foi lembrada na palestra “Redução da pobreza pela inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho”, feita pelo primeiro desembargador cego do Brasil, Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, na sede do Banco Mundial, em Washington (EUA), em dezembro de 2014, a convite da Organização Internacional do Trabalho.
O magistrado teve visão reduzida desde a infância e na escola regular a orientação era para que fosse transferido para o Instituto de Cegos Padre Chico, tradicional escola paulistana que atende crianças deficientes visuais ou com baixa visão. A família não aceitou e o futuro juiz estudou em escolas regulares e se empenhou em levar uma vida normal. Em 1990, prestou concurso para a magistratura, foi aprovado, mas não assumiu. O tribunal de São Paulo entendeu que o fato de ser cego o impedia de exercer a função. “Doeu muito. Não esperava que o Judiciário fosse tão refratário.” O argumento legal brotou de um precedente do Supremo Tribunal Federal (STF) de 1981, segundo o qual um cego estava limitado pelo fato de não ter acesso à prova real ou não poder enxergar uma testemunha ou réu.
Um ano depois, prestou concurso para o Ministério Público Federal e entre mais de 4,5 mil candidatos entrou em sexto lugar. Por 18 anos exerceu a carreira de procurador até ser nomeado em 2009 para a função de desembargador do TRT em Curitiba.
Veja trechos de sua fala sobre conquistas de direitos do trabalhador com deficiência:
“Com relação às pessoas com deficiência, houve uma grande conquista de direitos somente em 1988, quando se rompeu com a ditadura militar no Brasil, pela promulgação da mais democrática Constituição brasileira. As pessoas com deficiência eram conhecidas por inválidas, incapazes ou excepcionais (anormais) e, por isso, beneficiárias do assistencialismo paternalista organizado por entidades sem fins lucrativos e organizações não governamentais, cuja atuação não alcançou a verdadeira inclusão destas pessoas. Criaram-se escolas especiais para cegos, surdos e deficientes mentais, as quais os mantinham isolados, não havia qualquer inclusão de pessoas com deficiência no trabalho, ou na sociedade”.
Inclusão no mercado de trabalho:
“O artigo 1º da Constituição elege como valores fundantes da República a dignidade da pessoa humana, a cidadania, bem como o valor social do trabalho e da livre iniciativa. O artigo 3º, ao seu turno, obriga o Estado Brasileiro a construir uma sociedade livre, justa e solidária e eliminar a pobreza e o preconceito. O art. 7º, inciso XXXI, proíbe que se discrimine a pessoa com deficiência em relação ao acesso ao emprego e à remuneração.
A Constituição Federal também determina que ‘A lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão’. Na esfera privada, também se institui a obrigatoriedade de reserva de postos a portadores de deficiência (Lei de Cotas).
Na esfera privada, o decreto delineia a inserção competitiva, a inserção seletiva, as oficinas protegidas e o trabalho independente, autônomo. A questão aqui é mais complexa, pois a visão excessivamente assistencialista que predomina na legislação e nas próprias entidades que atuam com deficientes tem impedido a verdadeira inclusão. A intermediação de mão-de-obra por associações tem sido exagerada e injustificada. Os trabalhadores com deficiência têm recebido salários reduzidos e tratamento injustamente discriminatórios. Por outro lado, o beneficio assistencial, concedido às pessoas com deficiência, finda por desencorajá-las ao ingresso no mercado de trabalho, o qual exclui o benefício em questão.
A maior dificuldade alegada pelas empresas, para o cumprimento das cotas, é a falta de qualificação profissional. Seria interessante a adoção de contratos de aprendizagem, na forma da Lei 10.097/2000 (Lei do Aprendiz), que admite a intermediação de entidades sem fins lucrativos com vistas à ‘formação profissional’, bem como programas públicos de formação profissional”.
Intermediação do Ministério Público:
“O Ministério Público do Trabalho acredita que as medidas coercitivas não são as melhores, porque devemos reverter uma tradição secular de assistencialismo, o que é culturalmente difícil. Tem adotado, por isso, o diálogo social para convencer empregadores, autoridades e entidades da plena cidadania da pessoa com deficiência, o que tem sido bem sucedido.
Fontes: http://www.ame-sp.org.br/noticias/jornal/novas/tejornal70.shtml;
http://www.cartacapital.com.br/revista/802/as-aparencias-enganam-3001.html